Sempre que o Ocidente e a Ucrânia respondem à escalada russa, fornecendo novos tipos de armas e equipamentos, a Rússia e os seus proxies, incluindo a panóplia de “especialistas” avençados ou simpatizantes que pontificam nas televisões, além de desvalorizarem e reafirmarem que isso é “contra a paz”, tiram da cartola o já conhecido coelho da ameaça nuclear.
Lembremo-nos que há um ano, quando invadiu a Ucrânia não ocupada, a retórica ameaçadora acompanhou o desencadear das operações. A racionalidade destas campanhas de comunicação é óbvia: trata-se de dissuadir o Ocidente de apoiar o país invadido.
Como já escrevi, no estudo prévio de situação que a Rússia fez antes de se lançar nesta guerra, o Ocidente era visto como fraco, dependente, acomodado e incapaz de ir além de algumas declarações condenatórias, e sanções simbólicas, como tinha acontecido antes, nas invasões da Geórgia, da Crimeia, da Moldávia e das regiões fronteiriças da Ucrânia. Como tal, bastaria, segundo os estrategas do Kremlin, brandir a ameaça apocalíptica, para garantir que ninguém se meteria na luta.
Este pressuposto não se verificou e os países ocidentais têm vindo paulatinamente a enviar mais defesas aéreas, artilharia e veículos blindados para o Teatro de Operações, reforçando a capacidade defensiva da Ucrânia e, dando-lhe também a capacidade de planear e executar operações móveis que lhe permitam recuperar o território perdido.
Para os russos trata-se de péssimas notícias dada a sua reiterada incapacidade para fazer avanços significativos, mesmo nos territórios que declarou anexados.
E a cada falhanço ou desenvolvimento desfavorável, a Rússia renova as suas ameaças nucleares, claramente destinadas a convencer os media ocidentais e os povos, de que pode usar armas nucleares ou escalar a guerra de alguma forma.
É isto que, de resto, dizem repetidamente na TV, os nossos “zenerais”, reiterando até que a “Rússia não pode perder”.
No fundo, cumprem o seu papel de amplificar a campanha comunicacional russa, repetindo, por exemplo, as palavras recentes do presidente da Duma (Parlamento russo), Vyacheslav Volodin, segundo as quais, “O fornecimento de armas ofensivas ao regime de Kiev levaria a um desastre global. Se Washington e os países da OTAN enviarem armas que serão usadas para ataques a cidades pacíficas ou tentativas de ocupar as nossas terras, isso provocaria medidas de retaliação com o uso de armas mais poderosas”.
Esta ameaça reforça as palavras de Dmitry Medvedev, segundo o qual “A derrota de uma potência nuclear numa guerra convencional pode provocar a eclosão de uma guerra nuclear”.
Medvedev é já anedoticamente conhecido por sucessivas ameaças apocalípticas, mas as suas declarações têm claramente o apoio dos mais altos níveis. Esta gente não diz coisas por acaso, ou porque acordaram mal dispostos, mas porque se trata de uma estratégia cuidadosamente coreografada e planeada, para ameaçar o Ocidente. Sob a óbvia supervisão de Vladimir Putin.
É uma ameaça real?
Não, e os líderes ocidentais sabem-no bem.
Trata-se apenas de alimentar os ciclos dos media ocidentais e, por essa via, influenciar as percepções e os medos das pessoas que votam, procurando cavar uma fractura entre dois pilares da “trindade clausewitziana”, o povo e poder político.
A Rússia procura também desviar o foco mediático, das suas acções para as acções do Ocidente e esboçar algumas linhas vermelhas para ter uma desculpa para escalar, se quiser ou se já tiver isso planeado.
O actual debate sobre o envio de modernos carros de combate, é o exemplo óbvio deste facto.
Todos os dias os media se focaram nas eventuais divisões entre aliados, na pressão sobre a Alemanha, com a exploração de fantasmas históricos, na mobilização de outras vozes para fazer parecer que é a Ucrânia que não está interessada na “paz” e que pretende escalar e prolongar a guerra.
No fundo para tentar passar para o segundo plano das percepções, o facto de que foi a Rússia que escalou e invadiu a Ucrânia.
E no terreno?
No Teatro de Operações, tudo indica que a Rússia se prepara para exercer o esforço numa ofensiva para ocupar todo o Oblast de Donetsk.
A nomeação do Gen Gerasimov, o deslocamento de forças blindadas da Bielorússia para Donetsk, os movimentos logísticos reportados recentemente, o recrudescimento de flagelações ligeiras ao longo de toda a frente, etc, são indícios fortes de que isso irá acontecer brevemente.
Cabe à Ucrânia preparar o campo de batalha e planear cuidadosamente uma defesa que, na minha modesta opinião, deverá ser dinâmica e não estática, significando isto que a prioridade deve ser a destruição das forças atacante, canalizando-as para zonas de morte, e não a manutenção da posse do terreno.
Para tal, os recentes abastecimentos de meios mecanizados e blindados, bem como a profusão de meios anticarro e artilharia de grande precisão, serão fundamentais.
José do Carmo
*O autor escreve segundo a anterior norma ortográfica.
José Carmo / Janeiro 28, 2023
Ao nivel do transtorno paranoide e do.papaguear da propaganda soviética, o caro leitor está francamente bem.
/
Carlos2 / Janeiro 29, 2023
Os meus comentários desapareceram?
/