Nuclear: um debate que faz falta

Após o polémico projeto de resolução do PAN, que visou manifestar a oposição da Assembleia da República à classificação da energia nuclear e do gás natural como energias sustentáveis, notou-se um esforço na maioria dos partidos em alimentar a narrativa mainstream contra a energia nuclear.

Não podemos falar de energia nuclear em Portugal sem falarmos da Alemanha, que tem servido de exemplo para a análise das vantagens e desvantagens da energia nuclear na contemporaneidade.

À data de hoje, o Grüne (Verdes) é o segundo maior partido nas sondagens e faz parte de uma coligação governativa com grandes desafios. As consequências de uma crescente influência deste partido eco-socialista e da tentativa de apaziguamento do seu eleitorado, por parte de Angela Merkel, são simples e notórias: desde o início da década anterior, tivemos uma redução para mais de metade do peso energético da energia nuclear na Alemanha. Algo que só foi atingido graças ao encerramento de várias centrais nucleares.

Mais encerramentos estão a ser idealizados até se atingir o objetivo de “0% energia nuclear”, datado para 2030. O custo não será fácil de sustentar, já que a Alemanha tinha preços de eletricidade para consumidores domésticos em níveis estonteantes, ainda antes do mais recente conflito bélico europeu. Qualquer eco-socialista que tenha lido até este ponto já pensou: “sim, mas é um sacrifício pelo ambiente porque precisamos de combater a poluição e as alterações climáticas”.

Infelizmente não é tão simples assim. A demagogia eco-socialista não justifica o falhanço político de Merkel no setor energético, que influenciou a economia alemã, além do falhanço diplomático e ambiental. Sim, ambiental, dado que o peso de fontes poluentes na produção energética, à medida que as vontades eco-socialistas estavam a ser cumpridas no papel, aumentou.

Um pouco mais a sul, no território português, temos um cenário político idêntico. Desde a extrema esquerda até aos sociais democratas, tivemos uma rejeição à energia nuclear. Compatível com o chumbo à energia nuclear, temos também o chumbo do nosso país quanto à capacidade para apostar nesta fonte energética, mesmo que o povo português assim quisesse, pois necessitamos de uma classe política responsável, transparente e séria no que diz respeito ao setor da energia e a políticas de obras públicas. Até o leitor mais apático tem conhecimento de escândalos que justificam a perceção cada vez maior de que os partidos que nos têm governado não merecem confiança para tamanho encargo.

Se há diferença na capacidade das duas classes políticas, Portugal e Alemanha entram novamente em sintonia quando o assunto são os impactos do persistente eco-socialismo, que no caso português resultou num dos piores países da Europa no que toca a assegurar aquecimento nas casas das famílias do seu povo. Curiosamente, a Alemanha é conhecida por ser uma anomalia em termos de países mais desenvolvidos com uma alta percentagem de habitantes que não conseguem aquecer as suas casas (ligeiramente acima da média da UE). Se calhar esta é a convergência europeia de que o nosso primeiro ministro tanto fala.

Devido ao facto de que sem uma fonte de energia alternativa e viável, uma vez que as renováveis são fracas pelas limitações tecnológicas e não produzem energia na mesma quantidade de tempo ao longo de um ano, não é descabido afirmar que seremos penosamente forçados a seguir um caminho parecido ao dos Alemães, que optaram pelo lignito (carvão castanho).

Fora das comparações entre países, mas em crítica ao eco-socialismo que lhes é comum, estamos perante uma ideologia que esquece, ou gosta de ignorar, que a energia eólica ainda é um negócio europeu, mas não por muito tempo, pois a tendência é que aconteça como a energia solar, que costumava ser um negócio ocidental, mas agora é uma indústria chinesa. Das 10 maiores empresas de energia solar do mundo, 7 são chinesas. Nenhuma é europeia (o Grupo REC da Noruega costumava estar incluído, mas agora é propriedade da ChemChina) e uma é americana, a First SolarFSLR, que também fabrica na Ásia. Alimentar um rival económico, que também é um obstáculo ao dito “futuro sustentável”, devido ao seu estatuto como país mais poluente do mundo, é no mínimo contraproducente.

Algo que os eco-socialistas também esquecem, é que a energia nuclear surge como a mais rentável em relação ao custo investido, e produz grandes quantidades de energia sem carbono em menos espaço do que qualquer outra fonte “renovável”. De acordo com o Departamento de Energia Nuclear dos Estados Unidos, uma instalação nuclear típica de 1.000 megawatts precisa de pouco mais de uma milha quadrada para operar. Em contrapartida temos os parques eólicos, que exigem 360 vezes mais área de terra para produzir a mesma quantidade de eletricidade, e as usinas solares fotovoltaicas a exigirem 75 vezes mais espaço.

Aquilo que o eco-socialismo não esquece, mas ignora, é a desmistificação sobre o preconceito comum relativo à vida útil dos reatores. De acordo com o Office of Nuclear Energy, a maioria dos reatores está licenciada para operar quarenta anos, com muitos já estendidos para sessenta, tendo algumas sido estendidas para oitenta anos de operação. E não podia acabar com os mitos, sem falar nos resíduos nucleares, que são quase inteiramente combustível nuclear gasto. Um facto curioso, e que devia ser mais propagado por quem defende a solução nuclear, é que as barras de combustível usadas pela indústria nuclear comercial, desde o final da década de cinquenta, poderiam ser empilhados num único campo de futebol. Além do mais, a recente aposta da Finlândia num repositório geológico profundo representa mais um passo na segurança deste setor.

Embora eu tenha referido apenas a energia nuclear por motivos de excessiva extensão textual, todos estes dados e diferentes fontes de energia devem ser seriamente debatidos e aprofundados, seja a nível individual ou social. Enquanto ainda se vai começar a debater este tão importante tema no nosso território, temos países na Europa que pretendem exercer uma errónea pressão contra a energia nuclear, e de forma discreta, a China continua o seu investimento massivo nesta fonte energética. Algo compreensível, uma vez que é uma forma de aumentar a produção com um impacto ambiental bastante inferior.

Contrariamente, afirmo que é incompreensível a precoce varredura desta opção para debaixo do tapete. Enquanto não ultrapassarmos a fase do tabu, continuaremos reféns de grandes faturas na eletricidade e do carvão, que por sua vez alimenta(rão) os discursos dos eco-socialistas.


Francisco Pereira Araújo

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