A eletricidade sempre foi considerada a forma mais nobre de energia porque pode, com bom rendimento e com grande potência, ser convertida em calor, luz, trabalho. O transporte da eletricidade é feito através de um conjunto de linhas que, uma vez construídas, duram vários anos com despesas modestas de manutenção e baixas perdas.
O grande problema da eletricidade é que o seu armazenamento em grandes quantidades é caro e acarreta perdas significativas de energia. Considera-se que a bombagem seja a solução menos cara e com perdas aceitáveis. A transformação da eletricidade em combustível (seja hidrogénio ou amónia) exige enormes investimentos e implica perdas elevadas.
Passaria pela cabeça de alguém instalar em sua casa um eletrolisador para produzir hidrogénio a partir da eletricidade e depois utilizá-lo para cozinhar quando pode converter a eletricidade diretamente em calor num fogão elétrico com menos perdas? A não ser que… Sim, pode haver vantagem económica: produzir hidrogénio quando a eletricidade for barata e usá-lo, em vez dela, quando for cara. Mas há que fazer contas porque pode, mesmo assim, não compensar.
Outra razão que pode justificar a degradação da eletricidade em combustível é que este seja necessário para abastecer um automóvel dotado de pilhas de combustível. Mas aqui há que fazer ainda mais contas porque esse hidrogénio, além da eletrólise vai precisar de ser comprimido e arrefecido até à liquefação para ser possível concentrá-lo em depósitos de dimensão adequada e esta operação exige mais investimento e traduz-se em mais perdas energéticas. Outra ideia não menos peregrina é transformar o hidrogénio em amónia líquida com perdas ainda maiores e elevado investimento.
O armazenamento da eletricidade em baterias é tecnicamente mais simples e prático. Já se usa em diversos equipamentos de baixo consumo como computadores, telemóveis, ferramentas, etc., porque o armazenamento de grandes quantidades requer equipamentos volumosos e pesados. Porém, a utilização em veículos já é comum, apesar das limitações de volume e peso não permitirem autonomias comparáveis às dos veículos convencionais com motores de combustão e o tempo de recarga ser longo – e se se usar a carga rápida tende a diminuir-se a vida das baterias). A vida das baterias de lítio pode atingir entre cinco e dez anos e, sendo elas muito caras ainda, significa que o custo da sua substituição se deve distribuir pelo tempo de vida, equivalendo assim a um custo por kWh igual à da gasolina ou superior até. Poucos fazem estas contas na compra de um veículo elétrico. Mas o armazenamento da eletricidade em baterias em quantidades industriais é ainda uma miragem dado o seu custo proibitivo face a outras alternativas.
Porém, o recurso cada vez maior às “energias verdes” (sol e vento) que, além de “verdes”, são intermitentes, torna o armazenamento da eletricidade incontornável, para que a procura possa ser satisfeita – haja ou não haja vento, faça ou não faça sol.
A eletricidade tende, pois, a descer do patamar de energia final e nobre ao nível de uma energia primária como a do carvão, do petróleo ou do gás natural. Produz-se energia elétrica, transforma-se em energia contida num combustível e este é depois novamente convertido em eletricidade para uso final e nobre. Mas decerto a um preço igualmente nobre…
Henrique Sousa
Editor para Energia e Ambiente do Inconveniente