Como pode Portugal compensar 7% do consumo de gás natural?

Segundo informou o ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, o acordo alcançado pelos estados-membros da União Europeia no dia 26-7-2022 para redução do consumo de gás em 15%, só será aplicado parcialmente a Portugal por não haver interligações com o resto da Europa. O corte não deverá exceder, assim, os 7%.

Embora a redução seja inicialmente voluntária, a Comissão Europeia poderá vir a torná-la obrigatória. O acordo tem agora em conta “a situação geográfica ou física” dos estados-membros, permitindo-lhes um tratamento de exceção caso tenham fracas interligações de gás com outros países da União ou para proteger a sua indústria e a produção de energia elétrica, ou tenham redes elétricas não sincronizadas com o sistema elétrico europeu e dependam fortemente do gás para a produção de eletricidade ou em caso de um aumento superior a 8% no consumo de gás no último ano.

A redução da procura/importação de gás será entre 1 de agosto de 2022 e 31 de março de 2023, relativa ao seu consumo médio nos últimos cinco anos, com medidas à escolha dos estados-membros.

Se Portugal tiver que reduzir o consumo de gás em 7% em relação à média dos últimos 5 anos, que medidas poderá tomar? De acordo com a Pordata, a média do consumo de gás (entre 2017 e 2021) é de cerca de 5.000 milhares de tep (toneladas equivalentes de petróleo), cerca de um quarto do consumo total de energia primária de cerca de 20.000 milhares de tep:

Uma redução de 7% no consumo de gás corresponde a 350 milhares de tep a menos, para consumo direto e produção de eletricidade. Na produção de eletricidade o gás garante cerca de 30% da produção total. Nos dois setores trata-se de saber como se pode reagir de modo a minimizar os efeitos negativos da falta de 7% de gás.

Na produção de eletricidade, o gás tem um papel que não pode ser substituído pelas energias eólica e solar, pois o gás destina-se a garantir uma potência firme que serve para preencher as ausências aleatórias daquelas. Na atual situação, a segurança da produção de eletricidade baseia-se no gás e na importação de Espanha, que estará também a tentar solucionar a sua própria escassez de gás.

No consumo direto (doméstico e industrial), a falta de gás apenas poderá ser compensada por medidas de poupança, de maior eficiência ou alteração dos consumos de gás para os de outras fontes, mas de realização morosa. Estas outras fontes alternativas podem ser derivados de petróleo, biomassa, auto-produção ou eletricidade, embora esta provenha em parte do próprio gás, o que faria aumentar o consumo de gás primário que se pretende reduzir.

Entre a escassez de gás para consumo doméstico e industrial e a escassez de gás para a produção de eletricidade, é mais racional cortar na produção de eletricidade porque esta pode, de forma mais rápida e simples ser substituída, por exemplo com a reativação das centrais a carvão e a importação de eletricidade de Espanha – se possível. Uma eventual interligação elétrica da Espanha à França possibilitaria ainda a importação de França, porém esta deve ter de atender às necessidades de outros países vizinhos carentes como a própria Alemanha.

Se o consumo direto de gás (doméstico e industrial) permanecer inalterado e for compensado pelo corte na produção de eletricidade, a redução de gás para produção de eletricidade irá ser de muito mais que os 7% preconizados, podendo ser da ordem dos 20%, ou seja, a produção de eletricidade de uma outra fonte confiável será a única solução.

Portanto, a exemplo da Alemanha e no imediato, seria previdente retomar a produção de eletricidade a partir do carvão já que, mesmo que houvesse uma produção elétrica em excesso, isso possibilitaria substituir o gás por eletricidade nos consumos diretos, melhorar a eficiência da utilização de energia com bombas de calor por exemplo, e redução do saldo importador. Além disso, se a mobilidade elétrica tende a aumentar, a procura de eletricidade idem.

Devemos ainda referir que a entrada em funcionamento do complexo hidroelétrico do Tâmega não é considerada no aumento da produção de eletricidade, porque o saldo entre o que produz e o que consome para armazenamento de energia (com perdas de até 30%), pode ser nulo ou bem perto disso. Trata-se de um investimento que faz sentido porque há demasiada energia intermitente a entrar na rede, podendo ser armazenada para as horas de maior consumo. Ao mesmo tempo, a sua influência no diagrama de carga (com o aumento da capacidade de armazenamento em 30%) pode melhorar a utilização das centrais a carvão cujo encerramento se deveu à sua péssima utilização.

A teimosia política do governo em não reativar as centrais a carvão poderá custar enormes sacrifícios ao país, principalmente se a produção hídrica não puder responder por falta de água. Para garantir a produção de eletricidade com gás em detrimento do consumo direto de energia, este sofrerá cortes muito superiores a 7%, estrangulando a economia e sacrificando as famílias com interrupções de fornecimento de gás. Um corte uniforme de 7% geral, prejudicaria a produção de eletricidade e os consumos diretos.

A energia em falta de 350 milhares de tep de gás geraria cerca de 2000 GWh de energia elétrica por ano, com um rendimento de 50%. Uma central de 300 MW a carvão, funcionando durante todo o ano na base seria suficiente para cobrir o défice de gás.

Henrique Sousa

Editor para Energia e Ambiente do Inconveniente

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Sub-diretor do Inconveniente

Latest comments

  • Os VE já não são prioridade? 😂

  • Claro que irá aumentar, não 40%, mas 38%, com um povo zombie controlado pelos media de um grupo de capitalistas para que funcionem com mentiras e com conteúdos informativos da LUSA, não sei se é o nome da coisa e esta controlada pelo PCPe BE, ou seja como dizia, acerca do que se transformaram os cidadão. Diogo Hoffbauer, num artigo a não perder publicado no Observador,Se é esta massa uniforme e submissa que nos informa, como podemos aspirar a mais do que sermos massa uniforme e submissa?
    Tudo isto depois das palavras arrogantes de uma “Ponha-se no lugar do jornalista” de uma big fish do Ministério da Propaganda , com o nome politicamente correcto “agência noticiosa”, de nome Helena Ferro Gouveia acerca da proibição da emissão de canais russos no Ocidente, “porque os cidadãos não têm capacidade, o conhecimento ou a literacia mediática para desconstruir narrativas.”; teve a ver com a questão de não se questionar os media ocidentais: a existência de armas de destruição massiva no Iraque, que justificaram uma intervenção militar trágica de óbvio interesse estratégico, ainda hoje com as consequências que todos os dias conhecemos, a invasão do Ocidente pelo Islão, apoiados por ONGs, do grupo globalista da Arábia Saudita, intocável, apoiada pelo Presidente actual dos USA Barack Hussein Obama, Clinton e toda a panóplia da extrema esquerda comunista americana, daí a resposta “Ponha-se no lugar do jornalista”.
    Mas a frase inicial do artigo é de uma actualidade e verdade digna repetida até à exaustão:
    Se é esta massa uniforme e submissa que nos informa, como podemos aspirar a mais do que sermos massa uniforme e submissa?

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