China e a política de Covid Zero

Segundo artigo da France 24 de 7-1-2022, o caso angustiante de uma mulher chinesa grávida a quem foi recusada ajuda médica imediata num hospital da cidade de Xi’an no norte da China, por não ter um teste negativo à Covid, está a reacender a discussão em torno da política chinesa de Covid Zero. A mulher acabou por sofrer um aborto espontâneo, tendo o hospital apresentado as suas desculpas com a justificação que a admissão sem teste violava as regras sanitárias e que a cidade se encontrava em rigoroso confinamento devido ao aumento de casos de Covid-19.

“O país onde o novo coronavírus foi detetado pela primeira vez em 2019 é agora um dos últimos na lista de casos e mortes Covid, com recurso ao confinamento de milhões, mesmo numa altura em que Pequim se prepara para sediar os Jogos Olímpicos de Inverno no mês próximo”, avança-se no referido artigo.

A política de Covid Zero consiste, para além das de higiene, em:

  • confinamentos rigorosos
  • testes em massa imediatos
  • controlo de fronteiras
  • quarentena rigorosa dos que entram na China
  • aplicativos de rastreio obrigatórios

As pessoas na China podem ser proibidas de deixar os prédios onde residem ou forçadas a permanecer em quartos de hotel, se forem consideradas “contactos de alto risco”. A cidade de Xi’an foi fechada em dezembro, forçando os seus 13 milhões de moradores a permanecer nas suas casas. Os voos internacionais são uma fração dos níveis pré-pandemia e obriga os passageiros, à chegada, a uma quarentena rigorosa que pode demorar semanas.

Esta política sanitária chinesa tem dado resultado? Em termos de números da pandemia, parece que sim:

“Ainda não há capacidade de impedir o aparecimento de casos locais únicos, mas temos a capacidade e a confiança para extinguir rapidamente o surto quando um caso local é encontrado”, disse o funcionário da Comissão Nacional de Saúde, Liang Wannian, a jornalistas no mês passado, ainda segundo artigo da France 24.

Mas a política de Covid Zero tem um preço. As áreas fronteiriças, especialmente junto a Mianmar, sofreram bloqueios quase constantes e provocaram o êxodo de muitas empresas. As comunidades confinadas queixam-se do acesso precário a alimentos, bens vários e a tratamento médico. Trabalhadores migrantes ficam isolados das suas famílias durante meses devido às regras e restrições onerosas de viagem.

Além disso a fiscalização pesada tem provocado a indignação geral – como quando agentes sanitários espancaram um cão até a morte depois da proprietária ter sido enviada para quarentena num hotel próximo, tendo a cena sido filmada por uma câmara de segurança.

Analistas dizem que as repetidas paralisações de fábricas e empresas contribuíram para a desaceleração do país, apesar da China ter sido a única grande economia em expansão em 2020.

“A China certamente mostrou que é viável continuar a estratégia de Covid Zero quase indefinidamente”, disse Ben Cowling, epidemiologista da Universidade de Hong Kong, à Agência France Press.

O país está isolado do mundo desde março de 2020 e proibiu praticamente a entrada de estrangeiros. O turismo internacional desapareceu e o governo disse que não renovará passaportes chineses vencidos, a menos que o titular tenha um bom motivo para viajar.

O país não reabrirá até pelo menos depois dos próximos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Inverno em Pequim, estando o governo a resguardar zelosamente a capital com restrições apertadas antes dos Jogos.

Aqueles que questionam a Covid Zero enfrentam a reação nacionalista. O médico chinês Zhang Wenhong escreveu em julho que os países devem eventualmente “aprender a coexistir com o vírus” – provocando ataques de trolls nacionalistas online.

Pesquisadores da Universidade de Pequim alertaram que a China pode sofrer um “surto colossal” que sobrecarregaria o seu sistema de saúde se relaxasse as restrições para um nível semelhante ao da Europa e dos EUA.

Ivan Hung, especialista em doenças infecciosas da Universidade de Hong Kong, disse que as vacinas de segunda geração direcionadas às variantes Delta e Omicron – bem como taxas de vacinação próximas dos 100 por cento – podem evitar um desastre. Nesse cenário, “é provável que o Covid seja semelhante à gripe”, disse Hung.

Mas deixar o vírus entrar pode ser arriscado para o presidente Xi Jinping, que busca um terceiro mandato em outubro, depois de se apresentar como um líder que sempre manterá a China segura.

“Quando chegar, a transição pode não ser fácil porque a sociedade chinesa acostumou-se a um baixo nível de transmissão”, disse Thomas Hale, da Universidade de Oxford, à France Press.

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Sub-diretor do Inconveniente

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